MENSALIDADES ESCOLARES EM TEMPO DE CORONAVÍRUS
- J. Garcia Advogados
- 21 de mai. de 2020
- 9 min de leitura
Diante da suspensão de aulas presenciais e da desaceleração econômica por conta da pandemia do novo coronavírus, pais e responsáveis de escolas particulares começaram a questionar a cobrança da mensalidade escolar durante a quarentena.
Ao todo, a rede privada de ensino conta com mais de 42 milhões de instituições e 9,2 milhões de alunos matriculados, cada um com uma realidade distinta. A disparidade de infraestrutura entre as escolas e as diferenças socioeconômicas entre as famílias têm gerado uma discussão com relação a suspensão, ou não, do pagamento da mensalidade.
A realidade das instituições de ensino
Entre 6 e 17 de abril, a plataforma Melhor Escola realizou uma pesquisa com 563 instituições privadas, desde o Ensino Infantil até o Ensino Médio e revelou dados interessantes. Das escolas entrevistadas, 84,5% estão mantendo aulas a distância, enquanto 15,5% cancelaram suas as atividades pedagógicas por completo.
A fim de minimizar as consequências no calendário escolar, o presidente Jair Bolsonaro assinou a MP 934/200 que suspende, em caráter excepcional, o cumprimento dos 200 dias letivos para escolas e universidades, mas mantém a obrigatoriedade de carga horária mínima estipulada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).
Como alternativa para atender as medidas tomadas pelo governo, as escolas seguiram diferentes protocolos. No estudo feito, 45% das instituições anteciparam as férias escolares e 47% irão repor as aulas após o término do isolamento social.
Diversas escolas já estão sentindo os efeitos da crise provocada pela Covid-19. Cerca de 85% das instituições entrevistadas afirmaram que os pais já estão solicitando a revisão da mensalidade escolar. Mais da metade, 58%, já teve ou terão matrículas canceladas.
Quando questionadas sobre a possibilidade de renegociar o valor cobrado, cerca de 75% das escolas diz que estão dispostas a flexibilizar as condições de pagamento.
Quais são os direitos dos pais em relação a redução ou reembolso da mensalidade escolar durante a quarentena?
Atualmente, tramita no Congresso Nacional o projeto de Lei 1119/20, que obrigará as escolas privadas do ensino fundamental e médio a reduzirem as suas mensalidades em, no mínimo, 30% enquanto as aulas presenciais permanecerem suspensas devido a pandemia da Covid-19.
Paralelamente, no mês passado, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, emitiu uma nota técnica com recomendações para o consumidor.
A Nota Técnica decorreu, entre outras causas, da solicitação do Procon SP e adotou recomendações dos órgãos de defesa do consumidor dos estados do Rio de Janeiro, Pernambuco, São Paulo e Procons Brasil. O documento, elaborado pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) da Senacon, recomenda que consumidores não peçam reembolso parcial ou total de mensalidades em hipóteses que a escola se dispõe de outras formas a fornecer o serviço interrompido por força maior, seja por meio de aulas presenciais em momento posterior, seja pela oferta de aulas online, de acordo com as diretrizes do Ministério da Educação.
No caso de pedido de reembolso parcial, fora dessas hipóteses, a orientação é para que sejam exauridas as tentativas de negociação do rompimento contratual, de modo a minimizar ou cancelar eventuais multas contratuais, mas, ao mesmo tempo, estabelecer uma sistemática de devolução de valores pela instituição de ensino, quando cabível, de forma parcelada, evitando-se um ônus que, no presente momento, pode comprometer a capacidade econômico-financeira das empresas, a qual não deve ser anterior ao encerramento da atual quarentena e das medidas de combate à pandemia.
Por todo o Brasil, projetos de lei pedem descontos em mensalidades escolares
Levantamento do jornal Folha de São Paulo mostrou que em ao menos 11 estados, na Câmara dos Deputados e no Senado foram protocolados projetos de lei para obrigar escolas e faculdades particulares a dar desconto nas mensalidades durante o isolamento.
Ministérios Públicos Estaduais e órgãos de defesa do consumidor têm alertado os parlamentares que pode haver inconstitucionalidade em propostas como essas, por interferirem de forma injustificada na livre iniciativa das instituições de ensino.
Posicionamento do PROCON-SP
A Fundação Procon-SP publicou diretrizes para negociação dos consumidores com as instituições particulares de ensino infantil, fundamental e médio no contexto da atual pandemia de covid-19. As escolas do estado de São Paulo que não atenderem às diretrizes terão que apresentar sua planilha de custos, responderão a processo administrativo e poderão ser multadas.
De acordo com as diretrizes, deve ser oferecido um percentual de desconto na mensalidade escolar, cujo valor pode ser proposto pela própria instituição, de acordo com sua situação econômico-financeira. O Procon afirma que, embora livre o percentual de desconto a ser fixado, sua concessão é considerada diretriz obrigatória.
Além disso, desde o mês de abril, devem ser suspensas imediatamente as cobranças de qualquer valor complementar ao da mensalidade escolar, como alimentação, atividades extracurriculares, passeios, academia, serviço de transporte oferecido pela instituição de ensino, entre outros. Caso esses valores já tenham sido pagos no referido período, devem ser descontados na mensalidade subsequente.
Segundo o órgão, as diretrizes são resultado de uma crescente demanda dos consumidores no estado relacionada às dificuldades com instituições privadas que prestam serviços educacionais sobre o atendimento, ao ensino a distância e ao pagamento das mensalidades escolares. O objetivo das medidas é resguardar os direitos dos consumidores e de garantir o equilíbrio contratual.
As diretrizes definem também que a instituição que quiser implementar o ensino a distância deverá disponibilizar os meios tecnológicos para que o consumidor tenha acesso ao conteúdo. O Procon informa que o consumidor só poderá recusar o ensino a distância se não tiver infraestrutura, como tablet, computador ou celular com acesso à internet. Nesse caso, a instituição deverá apresentar como alternativa o plano de reposição de aulas ou o fornecimento da tecnologia necessária.
O documento estipula ainda que “é direito dos consumidores a rapidez no atendimento de suas demandas, bem como à análise de sua situação contratual de inadimplência, devendo a instituição negociar alternativas para o pagamento, como, por exemplo, maior número de parcelas”.
As escolas deverão disponibilizar ao menos um canal de atendimento ao consumidor para tratar das questões financeiras, e a existência desse canal deve ser comunicada a todos os seus consumidores, por meio tecnológico.
O órgão sugere que pais e responsáveis evitem cancelar ou pedir reembolso da mensalidade escolar visto que "são um parcelamento definido em contrato, de modo a viabilizar uma prestação de serviço semestral ou anual". A mensalidade então, é apenas uma forma de auxiliar as famílias a arcarem com os custos de educação.
Muitas pessoas alegam que não há justificativa para manter o mesmo valor sendo que as aulas presenciais foram canceladas. Porém, os custos como aluguel, salários dos professores e funcionários permanecem os mesmos. Além disso, diversas instituições estão investindo em tecnologia e capacitação dos seus profissionais para oferecer ensino remoto.
Vale ressaltar também que as escolas deverão cumprir com o que está descrito no contrato, seja através de aulas a distância ou da reposição do conteúdo após o término do isolamento social.
Por outro lado, o Procon-SP orientou os pais que têm filhos matriculados em escolas particulares a pedirem a planilha de custos para verificar se as instituições tiveram redução de gastos com a interrupção das aulas presenciais por causa da epidemia do coronavírus. Em caso de diminuição, eles podem exigir desconto na mensalidade escolar.
“Se a escola teve redução de custo por gastar menos com luz, água e outras despesas, deve repassar essa diminuição aos pais. É obrigação dos colégios apresentar essa planilha para as famílias”, disse Fernando Capez, diretor-executivo do Procon-SP e secretário especial de Defesa do Consumidor.
Fernando Capez, no entanto, reconhece que essas despesas são pequenas dentro do orçamento das escolas e que muitas unidades tiveram aumento de custos com a aquisição de equipamentos e plataformas online para manter as atividades a distância. Mas reforçou que os pais devem exigir que as despesas sejam apresentadas.
Ainda segundo Capez, caso a epidemia evolua por muitos meses e a interrupção das aulas seja prorrogada a ponto de o ano letivo não poder ser cumprido integralmente, o Procon-SP pode rever a posição. “As escolas não deixaram de cumprir o que está previsto em contrato com as famílias e ao que tudo indica as aulas poderão ser repostas até o fim do ano.”
A Secretária Nacional do Consumidor também se manifestou sobre o tema por meio da Nota Técnica 14/2020. “Se houver uma prorrogação do período de quarentena, de modo a inviabilizar a prestação do serviço em momento posterior no ano corrente, será necessário ajustar o contrato, com base na previsão de prestação dos serviços”, como nos casos dos contratos de educação infantil, que não possuem conteúdo acadêmico”, diz trecho do documento.
É importante que, neste cenário atual, as relações sejam conversadas entre os consumidores e fornecedores, que haja bom senso e transparência, de modo a se evitar surpresas e desgaste entre as partes e desequilíbrio na relação contratual outrora estabelecida."
Enfim, o que fazer: pagar a mensalidade ou não?
Inegável que estamos vivendo um cenário “perde-perde”, em que tanto a escola como os responsáveis sairão prejudicados. Isto não se aplica apenas à educação, mas também aos contratos imobiliários, de academias e tantos outros, que também estão sofrendo com a crise econômica decorrente do novo coronavírus.
Trata-se de situação ímpar, sem precedentes em nossos tribunais. Logo, até que seja sancionada alguma lei específica referente ao caso, a maneira mais indicada para solucionar as questões decorrentes da pandemia ainda é a boa e conhecida conversa, com o intuito de minimizar as perdas de ambos os lados e alcançar uma condição mais positiva em comum.
Como a lei ainda não está aprovada e não há nada que estipule ou defina um parâmetro legal para o desconto, as negociações devem ser feitas caso a caso, entre a escola e o responsável, observadas a prudência e o equilíbrio entre as partes. Questões como: disponibilização de aulas, provas e materiais online devem ser levadas em conta na hora de renegociar a cobrança.
Assim como existem diversos argumentos que defendem a redução da mensalidade escolar durante a quarentena, há outros que vão contra a ideia. Portanto, a situação deve ser analisada sob outra perspectiva, visto que, no fim, a manutenção do relacionamento é de interesse de ambas as partes, isto é, o proprietário da escola espera que sua instituição sobreviva à crise e também que o aluno continue estudando lá quando a tormenta passar, por outro lado, o aluno (ou seus responsáveis), quer evidentemente deseja continuar frequentando o colégio em que sempre estudou e para isso a instituição precisa sobreviver à crise.
Veja abaixo algumas dicas para conseguir encontrar a melhor saída em conjunto com a escola:
1 – Exponha sua situação financeira
Antes de procurar a escola é importante conhecer a sua situação financeira. Afinal, não vale a pena buscar um acordo que não conseguirá cumprir. Quanto mais se jogar limpo, e demonstrar a situação, mais a tendência é que o outro lado jogue limpo também.
2 – Negocie descontos em contas básicas
É justo que a escola conceda ao menos um desconto do que está economizando com contas básicas, como água, luz e alimentação. Ademais, os pais não devem financiar a crise das escolas. O consumidor é a parte mais vulnerável. Não é justo continuar a pagar por algo que não está usufruindo.
3 – Analise o que a escola está fazendo para lidar com a crise
A forma de lidar com a suspensão física das aulas é algo que deve ser considerado na hora da negociação. O colégio está se esforçando para manter as aulas e atividades dos alunos em casa? Disponibiliza chats e e-mails para tirar dúvidas? Oferece algum aplicativo ou site para acessar os conteúdos? Então o desconto não deve se estender para além de despesas básicas.
Caso contrário, o consumidor tem o direito de pedir um abatimento maior no valor do contrato de serviço, já que ele não está sendo prestado, ou seja, não adianta oferecer um serviço cheio de problemas técnicos ou no qual o atendimento é limitado.
4 – Peça para analisar a planilha de custos
Para que ocorra o equilíbrio, é necessário a garantia de que o desconto que está sendo proposto é justo. Ademais, por lei, a mensalidade de escolas, para serem reajustadas, precisam comprovar gastos adicionais. Por isso, é natural que os pais exijam comprovação de gastos e economias que estão sendo feitas agora, inclusive com contas básicas. Além disso, está previsto no Código de Defesa do Consumidor o direito de informação. A escola precisa ser transparente nesse momento delicado.
A planilha é especialmente importante nos casos em que a escola alegar que não pode conceder qualquer desconto porque seus custos aumentaram. A escola pode ter, por exemplo, que investir agora em um software que permita o ensino à distância. Esse custo pode impedir um desconto nas mensalidades, ainda que despesas básicas tenham sido reduzidas, ou um desconto menor.
5 – Busque alongamento dos prazos
Mesmo com o desconto concedido pela escola está difícil pagar as mensalidades? Você pode sugerir um desconto maior de forma temporária, que será reposto quando você voltar a ter fôlego financeiro, de forma parcelada. É uma forma de alongar a dívida, diluindo o valor no futuro.
6 – Não consegue mesmo continuar a pagar? Exija seu direito
A situação está mesmo complicada? Não houve negociação ou desconto suficiente para continuar a pagar as mensalidades? Você pode pleitear seu direito, garantido em lei, de que seu filho ou você mesmo possa terminar o ano letivo, mesmo que esteja inadimplente com as parcelas. A escola só poderá impedir a rematrícula, neste caso, até que a dívida seja paga.
Lembrando sempre que, a busca por advogado especializado para aconselhamento jurídico e defesa de seus interesses poupará você de uma quantidade considerável de estresse e turbulência, uma vez que a assistência jurídica profissional ajudará a definir claramente todas as questões em jogo.
Comentarios